O consenso está mesmo longe de pautar as decisões tomadas em assembleias gerais convocadas para definir rumos do seguro obrigatório DPVAT. Já conscientes dessa desarmonia, engendrada pelos conglomerados financeiros controladores da Seguradora Líder, que põem seus interesses acima de todos e de tudo, embora estejam sempre de costas para os beneficiários do seguro – as vítimas do trânsito – sete empresas dedicadas à operação do seguro, igualmente acionistas da Líder e proclamadas Grupo das Independentes (GI), resolveram reagir. Nas reuniões, têm selado a sua marca de atuação, nitidamente voltada para os tempos atuais de valorização da transparência e comprometimento com as melhores práticas de governança.
Assim em 29 de março, na última assembleia da Líder, o GI foi patente: “é fundamental que toda a sociedade (e isso inclui não só os acionistas da Companhia [Líder], mas seus clientes, a população protegida pelo DPVAT e os agentes públicos envolvidos) tenha acesso às discussões […], deixando clara e expressa as respectivas responsabilidades”. Em tempos de fraudes, o recado procura delimitar nitidamente fronteiras, contrapondo-se aos grandes grupos bancários.
E na linha definidora de limite, o GI sustenta, na referida assembleia, contrariedade à aprovação em bloco de alterações no estatuto social da Seguradora Líder, defendendo votação item a item. Em voto separado, o grupo defende, por exemplo (artigo 8º, § 9º), que “as decisões das Assembleias Gerais sejam formalizadas através de ata lavrada de forma sucinta, historiando brevemente os fatos e debates ocorridos, inclusive dissidências e protestos, indicando os votos proferidos pelos acionistas …”
Mais à frente, no artigo 10 do Estatuto, o grupo comenta que diante da investigação policial e administrativa que apura fraudes supostamente praticadas por administradores da Líder, não é “republicano” estender o prazo de mandato dos conselheiros (até 2021), bem como o da diretoria executiva por três anos (artigo 19, § 1º). “Os membros do Conselho de Administração e da diretoria devem ter mandato de um ano, permitida a reeleição”, defendem os sete signatários em manifestação de voto (União Seguradora, Comprev Seguradora, Comprev Vida e Previdência, Previmil Vida e Previdência, MBM Seguradora, Gente Seguradora e Capemisa Seguradora).
Em outra manifestação de voto, conforme transcrita na ata, o GI põe em foco a aprovação das Demonstrações Financeiras 2017 da Seguradora Líder, sobre a qual manifestam igualmente contrariedade. Para o grupo, o balanço “não representa fidedignamente a situação econômico-financeira da companhia”. Nele, “faltam provisões ou ajustes referentes às fraudes identificadas pelo Ministério Público de Minas Gerais e objeto de ação civil pública em curso, de investigação na Superintendência Seguros Privados (Susep) e no Tribunal de Contas da União (que já apurou que as fraudes geraram prejuízo em torno de R$ 2,1 bilhões à companhia)”. O voto aponta ainda divergência na constituição de provisões técnicas, questiona a distribuição de lucros e bônus e reflete sobre considerações feitas pela auditoria independente da KPMG, não disponibilizada para os acionistas.
A eleição da chapa apresentada para os cargos do Conselho de Administração também foi objeto de reprovação do Grupo das Independentes: “As signatárias [da manifestação de voto contrário] verificam que empresas capitaneadas por candidatos apresentados nesta chapa já foram citadas nos procedimentos policiais, administrativos e judiciais que envolvem as assim chamadas “fraudes do DPVAT”, razão pela qual lhes faltaria esse atributo fundamental [reputação ilibada]”. E finaliza: “É certo que está em curso no Tribunal de Contas de União processo que apura os prejuízos causados pelas “fraudes do DPVAT”, em montante superior a R$ 2,1 bilhões, e que responsabiliza todos os diretores e membros dos Conselhos de Administração e Fiscal da Companhia, exigindo a devolução dos valores das fraudes aos cofres da Companhia”.